liderança feminina negra

A trajetória de uma líder que fez da oportunidade sua missão

O Portal Eliana Gorritti traz mais um exemplo de força, garra e liderança feminina. À frente do Instituto Oportunidade Brasil, Verônica Lopes de Jesus é uma mulher que inspira não apenas pelo que conquistou, mas por tudo o que decidiu construir para os outros. Administradora com mais de 20 anos de carreira, tem no currículo um MBA em Marketing pela FGV, especialização em Políticas Públicas e Projetos Sociais pelo Senac, mestrado pela Fucape e formação executiva em Governança e Sustentabilidade pela Fundação Dom Cabral (FDC). Mas antes de tudo isso, Verônica começou sua trajetória no balcão de um McDonald’s.

Desde cedo, entendeu que o caminho seria desafiador, mas possível.“Logo no início da minha carreira, quando era mais impulsiva, aprendi uma lição que carrego até hoje: não tomar decisões de cabeça quente. Sempre espero passar uma noite antes de decidir, para que as ideias fiquem mais claras”, relembra. Esse autocontrole e clareza de pensamento se tornaram marcas registradas de sua trajetória.

Sua entrada na administração foi natural, fruto de experiências profissionais que a levaram a se encantar pela área. Mas foi ao se aproximar dos 40 anos que decidiu mudar de rota e aprofundar seus estudos no terceiro setor. “Gosto muito de aprender”, resume, com a simplicidade de quem vê o conhecimento como motor da transformação.

Como tantas outras mulheres brasileiras, Verônica precisou conciliar estudo, trabalho e vida pessoal. “Tive uma rede de apoio maravilhosa: minha mãe. Ter meu bem mais precioso com a pessoa em quem mais confio foi fundamental. Quando fui trabalhar em São Paulo, minha irmã também se mudou para lá. Sempre tive minha família por perto”, conta com gratidão.

liderança feminina negra

Quando a inquietação vira ação

A vontade de fazer mais pelos outros sempre esteve presente em sua vida. Durante anos, participou de ações voluntárias como o McDia Feliz, atividades com escoteiros e quase uma década na Junior Achievement. Mas ainda havia um incômodo.

“Nunca havia feito algo voltado especificamente para a população negra. E, mesmo hoje, frequento espaços em que sou a única pessoa negra presente”, relata.
Foi a partir de uma conversa com Luiz, cofundador do Instituto Oportunidade Brasil, que essa inquietação ganhou forma.

“Decidimos transformar esse desconforto em ação. Assim nasceu o IOB.”

O Instituto, que tem como foco a população negra e outras minorias, é mais do que um projeto, é uma resposta a uma realidade que Verônica conhece de perto.

“Como mulher negra, muitas vezes fui a única nos espaços profissionais que ocupei. Quando me tornei diretora executiva em SP, houve quem me confundisse com a secretária. A falta de representação é evidente. Mas o que falta não é potencial, é oportunidade”, afirma com firmeza.

Os dados corroboram sua fala: enquanto 56% da população brasileira é negra, 60% das pessoas negras não têm acesso a saneamento básico.

Quando uma vida muda, todos mudam

O impacto do Instituto é real e comovente. “Uma aluna, Evelyn, disse em uma apresentação: ‘De onde eu vim, sou vista como uma improvável’. Muitos jovens atendidos por nós chegam desacreditados dos seus sonhos”, conta Verônica, emocionada.

E cada conquista é celebrada como uma vitória coletiva: Stephany, a primeira da família a concluir o ensino médio; Maylon, que entrou na Ufes; e um grupo de jovens da periferia que desenvolveu três aplicativos do zero. “Às vezes, tudo o que falta é uma oportunidade.”

Mas os desafios não são poucos. Consolidar o IOB é, nas palavras de Verônica, “um sonho em movimento”. Além das dificuldades típicas enfrentadas por organizações do terceiro setor, como a captação de recursos e a sustentabilidade financeira, há também a resistência estrutural.

“Ainda há quem minimize essa realidade com discursos como ‘somos todos iguais’, ignorando as desigualdades que enfrentamos todos os dias.”

Gestão, parceria e propósito

Mesmo com pouco tempo de existência, o Instituto já foi premiado e conta com grandes parceiros. Para Verônica, isso é fruto de um trabalho feito com excelência, propósito e seriedade. “O que nos trouxe até aqui foram as oportunidades — de acessar uma boa educação, de contar com pessoas e empresas que acreditam que um mundo melhor se constrói com inclusão e diversidade. Além disso, uma gestão profissional, mesmo dentro de uma estrutura enxuta, faz toda a diferença.”

Pensando no futuro, o IOB está comprometido com o fortalecimento institucional e o crescimento sustentável. Isso inclui expandir o número de pessoas atendidas, investir em equipe qualificada e desenvolver produtos sociais que sustentem o impacto. “Também estamos explorando estratégias criativas de mobilização de recursos, como bazares inovadores e eventos beneficentes que engajam a comunidade. Estamos abertos a parcerias com todos que queiram caminhar conosco nessa missão.”

Verônica sabe bem o que representa ocupar espaços de poder sendo mulher negra no Brasil. E seu conselho para outras mulheres que desejam trilhar esse caminho é direto e potente:

“Que não se intimidem. Que estudem, se fortaleçam emocionalmente e construam uma rede de apoio. A caminhada é difícil, mas é possível.”

E Verônica não para. “Costumo dizer que minha lista é tão grande que não sei se vou zerar nesta vida (risos). Quero fazer doutorado, aprofundar meus estudos sobre o terceiro setor e ampliar nossos programas voltados para mulheres. Quero aumentar nosso alcance.”

Ao final da conversa, a pergunta parece inevitável: o que é “oportunidade”? Ela sorri e responde sem hesitar:

“Oportunidade é abrir uma porta onde antes só existia uma parede. É permitir que uma pessoa enxergue seu potencial e tenha condições de desenvolvê-lo. É isso que transforma vidas.”

plugins premium WordPress