Ela é empreendedora. Mãe. Filha. Parceira. Amiga. Profissional. Dona de casa. Coordenadora de agendas, de emoções, de refeições, de aniversários, de tarefas escolares. Cuida dos negócios e das pessoas. Gera receita e cuida da receita do jantar. É multitarefa por sobrevivência, não por dom. Usa todos os chapéus ao mesmo tempo e faz parecer leve, mesmo quando está exausta.
A mulher contemporânea vive entre conquistas e cobranças. Ganhou espaço no mercado, empreende, lidera. Mas, em muitos casos, sem que o sistema em volta tenha mudado. O que era atribuição exclusiva se acumulou ao que foi conquistado. O que era esperado ainda é cobrado e o que é novo, também. Resultado: uma sobrecarga silenciosa, normalizada, às vezes até romantizada.
A ideia de “dar conta de tudo” ainda é tratada como virtude. Mulheres que performam eficiência, equilíbrio e controle absoluto são elogiadas. Como se fosse natural equilibrar filhos, reuniões, autocuidado, casa arrumada, metas batidas e ainda sorrir com leveza. Mas o que essa cobrança ignora é o custo emocional, físico e mental de viver em estado permanente de alerta.
E há uma armadilha nessa multiplicidade: quando tudo é responsabilidade da mulher, qualquer falha também recai sobre ela. Se a casa está desorganizada, é porque ela não deu conta. Se o filho está cansado, faltou presença. Se o negócio não anda, faltou foco. Se ela para, é preguiçosa. Se segue, é insensível. O excesso de chapéus cria uma ilusão cruel: a de que ela escolheu carregar tudo, quando muitas vezes só tentou não deixar nada cair.
Essa cobrança não é só interna. Vem da cultura, da família, das redes sociais, do mercado, das instituições. E o mais perigoso: vem das próprias mulheres umas com as outras, reproduzindo o mito da supermulher como se fosse padrão e não exceção. Como se descansar fosse fraqueza. Como se pedir ajuda fosse admitir falha.
Mas ninguém sustenta esse ritmo sem desgaste. E não deveria precisar. O equilíbrio real não está em segurar todos os chapéus com maestria. Está em ter o direito de escolher quais cabem e poder tirar alguns, sem culpa, sem explicação.
É hora de desconstruir a ideia de que ser mulher é sinônimo de acúmulo. De que sucesso é fazer tudo ao mesmo tempo. Acredite em mim, não dá para fazer tudo ao mesmo tempo: escrevo esse texto sentada na cama enquanto minha sala está com o chão coberto de brinquedos que meu filho de 2 anos deixou e não catou, minha bebê dorme do meu lado e sendo sincera: meu cabelo está sujo. Aprendi que ou a casa está arrumada, ou eu estou arrumada ou as crianças, mas todos ao mesmo tempo é impossível, e ainda junta cozinhar, escrever, ler (se um dia eu tivesse tempo para tudo!). Talvez a maior força de uma mulher esteja, justamente, em saber quando é hora de tirar o chapéu, colocar os pés no chão e lembrar: ela não precisa provar nada a ninguém.



