liderar com empatia e bonito no discurso

Liderar com empatia é bonito no discurso, mas está custando caro para quem sempre foi ensinado a ceder

Nos últimos anos, o mercado se rendeu às chamadas soft skills como diferencial competitivo. Liderança empática, escuta ativa, inteligência emocional, segurança psicológica, todos termos que se tornaram palavras-chave nos processos de recrutamento, nas descrições de cargos e nas palestras de cultura organizacional. A ideia de que um bom líder não é apenas técnico, mas emocionalmente consciente, ganhou força e, à primeira vista, isso parece uma evolução. Mas há um custo que poucos estão dispostos a reconhecer: o peso desproporcional que esse novo ideal de liderança emocional tem colocado sobre os ombros de quem já carrega demais.

Em muitos ambientes, a exigência por empatia virou uma cobrança silenciosa dirigida, sobretudo, a mulheres, pessoas radicalizadas e lideranças não hegemônicas. Espera-se que essas lideranças tenham escuta aberta, inteligência emocional para lidar com conflitos, regulação constante das próprias reações e, ainda assim, mantenham a performance e a produtividade em alta. A contradição é evidente: o sistema cobra habilidades emocionais de quem vive inserido em estruturas que historicamente negam suporte, reconhecimento e espaço de poder.

Mais do que um diferencial, a inteligência emocional passou a operar como critério de sobrevivência. Mas diferentemente de outras competências, ela é exigida sem que sejam oferecidas as condições para exercê-la. Pouco se fala, por exemplo, sobre o que custa emocionalmente sustentar uma cultura de segurança psicológica em ambientes que ainda reproduzem microagressões, assimetrias de poder e padrões excludentes de liderança. O cuidado virou mais uma entrega e, pior, uma entrega esperada de quem menos recebeu.

É nesse ponto que o discurso da inteligência emocional se revela paradoxal. Ao mesmo tempo em que propõe uma humanização do trabalho, ele individualiza o problema. O incômodo precisa ser mediado, o conflito precisa ser acolhido, o trauma precisa ser processado, tudo isso sem que a estrutura se responsabilize pelas causas. Quem adoece emocionalmente, em vez de ser visto como sinal de um sistema em falência, é tratado como alguém que “precisa desenvolver melhor sua resiliência”.

Não à toa, são as lideranças emocionalmente mais envolvidas, geralmente mulheres, as mais vulneráveis ao burnout. Um estudo da McKinsey e da Lean In mostrou que mulheres em cargos de gestão sofrem níveis significativamente mais altos de esgotamento do que seus pares homens. A principal razão? São elas que mais oferecem suporte emocional às equipes, muitas vezes sem reconhecimento formal. Liderar com empatia virou função extra não remunerada.

É necessário, portanto, revisar o que se entende por inteligência emocional em contextos organizacionais. Desenvolver essa habilidade é, sim, uma vantagem, mas ela não pode ser mais uma exigência para quem já atua na margem. É preciso que ela venha acompanhada de estrutura, suporte institucional, redistribuição de responsabilidades e, principalmente, consciência de que o emocional não pode ser capitalizado sem custo.

A nova liderança que o mercado busca precisa ser emocionalmente madura, sim, mas isso só será possível quando o cuidado deixar de ser explorado como competência feminina e começar a ser integrado como valor estrutural. Enquanto isso não acontecer, seguiremos cobrando empatia de quem foi historicamente ensinado a ceder. E confundindo inteligência emocional com a capacidade de suportar o insuportável em silêncio.

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