No imaginário empreendedor brasileiro, o sucesso é celebrado como troféu e o fracasso, muitas vezes, silenciado como vergonha. O que não se diz , ou se evita dizer, é que quebrar faz parte do jogo. E não raramente, é ali, no fim de um ciclo, que se esconde o verdadeiro ponto de virada.
Falar sobre falência ainda é tabu. No discurso oficial, ouvimos histórias de superação, inovação e crescimento. Mas pouco se fala das empresas que fecharam, dos projetos que não decolaram, das dívidas que sufocaram, dos aprendizados amargos que não aparecem nas redes sociais. Quando um negócio não dá certo, muitos empreendedores se sentem sozinhos, culpados, deslegitimados. Como se o erro fosse um atestado de incompetência e não parte do processo.
A verdade é que empreender é, por definição, arriscar. E risco envolve incerteza, tentativa, acerto, erro e, às vezes, queda. Grandes nomes do mercado mundial falharam antes de acertar. Mas mesmo com essa consciência, ainda lidamos com o fracasso como se fosse o fim da linha. Isso cria uma cultura empreendedora frágil, onde só há espaço para os vencedores e onde a resiliência emocional, tão necessária quanto um bom plano de negócios, é negligenciada.
O impacto de um fracasso não se resume ao encerramento de um CNPJ. Ele atinge em cheio o emocional e as finanças de quem empreende. Há dívidas que se arrastam por anos, perdas patrimoniais, comprometimento do crédito pessoal. Em muitos casos, o empreendedor mistura recursos próprios com o fluxo da empresa e, ao quebrar, vê a vida pessoal implodir junto com o negócio. É comum que falência traga também crises de ansiedade, insônia, depressão e uma sensação paralisante de fracasso pessoal.
A falta de uma rede de apoio só agrava o cenário. Pouco se fala sobre saúde mental no empreendedorismo, menos ainda quando tudo dá errado. Não há espaços seguros para desabafar, compartilhar ou pedir ajuda sem medo de julgamento. É como se só existisse espaço para quem “vence” e o resto desaparece em silêncio.
Ao contrário do que se vê em ecossistemas mais maduros, onde o fracasso é encarado como parte do caminho e os erros viram combustível para novas ideias, aqui ainda falta uma cultura que reconheça que quebrar é, muitas vezes, a escola mais honesta do empreendedorismo.
É preciso normalizar a falência como parte do ciclo. Um negócio pode acabar, mas isso não significa que a jornada empreendedora tenha terminado. Muitas vezes, o aprendizado que vem do encerramento de uma empresa é mais profundo do que qualquer MBA. Aprende-se sobre gestão, mercado, gente, mas, principalmente, sobre si mesmo. Sobre limites, escolhas e o que se quer (ou não) repetir.
Também é hora de parar de glorificar o sucesso instantâneo e começar a valorizar a trajetória. A consistência ao longo do tempo, a capacidade de se levantar, repensar e voltar melhor. Porque empreender não é vencer sempre. É saber seguir mesmo depois de falhar.
Criar uma cultura empreendedora mais madura passa por permitir que erros sejam compartilhados sem medo. Que a quebra não seja vista como fim, mas como etapa. Que recomeçar seja respeitado tanto quanto começar. E que a coragem de tentar, mesmo quando não dá certo, seja reconhecida como um ato legítimo e, muitas vezes, necessário.
No fim, não é sobre evitar o fracasso a qualquer custo. É sobre não deixar que ele nos defina. Porque quem quebra e continua, não está fracassando, está insistindo em existir com mais verdade.